Momentos não vividos...
Após algumas leituras, em meio ao tema arrependimento, e até mesmo o recomendado arrependimento antes de morrer, eu tive a oportunidade (sinceramente
agradeço por isso) de poder acompanhar/observar bem de perto o período de
sofrimento, desprendimento material, resgate afetivo, convívio e reconhecimento
da colaboração, dedicação, amor, enfim a tantos sentimentos despertados e
percebidos pelo meu pai.
Envolvida em um ritmo diferente, acelerado, em um período de
grande tristeza, em que até a correnteza de um rio poderia mesmo mudar o seu
sentido que eu não me mostraria nem um pingo
surpresa, momento quase infinito em que sentiria um torpor pela ausência, por
não conseguir trazer os bons momentos de volta, não poder mais compartilhar a minha
insegurança, pedir conselhos a fim de receber palavras e gestos carregados de
experiência (mesmo não apreciando muito ouvir certas desaprovações acerca das
minhas constantes aventuras... Ah, saudade que quase me faz perder o foco!) –
Somente agora consigo, bem lentamente, relembrar alguns dos diversos momentos
de convivência e conflitos que me fazem despertar para o registro de grandes
aprendizados. Quanta força nós temos e tampouco percebemos o quanto podemos nos
doar...
Foram dois anos de cuidados paliativos. Uma grande luta de um
grande homem. Em seus vários diálogos, pensamentos, frases soltas e delírios,
ele sempre frisou certos arrependimentos. Por mais incrível que possa parecer,
esse cuidado em deixar claro o que sentia despertou em mim certa curiosidade e,
ao conhecer o trabalho de Bronnie Ware, cuja experiência descreveu em seu livro
Antes de Partir, tive a certeza de que deveria acompanhar esse momento. Era doloroso,
porém preciso. Era incerto. Era urgente.
Pode até parecer um tanto irônico, entretanto o modo como
foram explicitados os sentimentos dele tornaram aqueles momentos tensos em
confortantes e belos pelo modo como foram recebidos e interpretados por toda a
família. A ternura das palavras, a confissão de um sentimento tão íntimo, a
preocupação com a própria ausência, conseguir admitir o quanto poderia ter
aproveitado os momentos em família, ter a clareza da beleza da vida em família,
as viagens e passeios não realizados, os amigos que poderia ter visitado mais
vezes, os amigos que deixou de visitar, ter a consciência de que trabalhou
demais, e que já havia reclamado de algo que sequer conhecia profundamente...
Isto é apenas o começo de uma história de vida de uma pessoa
muito inteligente, criativa, de gênio difícil, mas que conseguiu reconhecer as suas
falhas, a bondade no próximo e agradecer aos amigos no momento oportuno, bem
como antes de partir.
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